sábado, 16 de junho de 2007

Globalização, nós corremos atrás dela.


A pouco tempo atrás fui convidado para conhecer Angola para fazer o projeto de uma grande loja de departamentos, e o cliente insistiu: -"Você tem que conhecer para entender". Agora, depois de passar algumas semanas lá, vejo que ele tinha toda razão. Se por um lado o país é completamente diferente do Brasil, com problemas bem mais complicados que os nossos e outros que já fazem décadas que superamos, por outro, o que o meu cliente talvez quis dizer é -"Apesar de estarmos em um país diferente, em um continente diferente, em uma cultura diferente, o seu projeto tem que ser moderno, arrojado e tão bom quanto qualquer projeto para qualquer canto do mundo".

Para quem não conhece a cidade de Luanda, ou talvez pior, para quem conhece muito bem, ainda assim fica difícil compreender. Como imaginar um projeto tão arrojado assim em um país onde a maioria das pessoas são analfabetas? Só há uma forma de ver o problema, é compreender melhor esse fenômeno chamado de Globalização.

Gostem ou não, sejam contra ou a favor, a realidade é que a Globalização tornou o mundo um lugar muito pequeno, onde o encontro de culturas, tecnologias, idéias e produtos criou uma nova civilização, a nossa nova civilização planetária, mais rápida, mais instantânea, mais competitiva.

Isso tem um lado devastador e cruel, ou até criminoso, quando valores culturais milenares entram em choque com os novos valores, quando economias despreparadas para a competição global vão à ruína, ou o aumento do desemprego decorre de uma comodite que despenca em uma bolsa de mercadorias e futuros, quando o câmbio aprecia nas mesas de operação dos grandes bancos e produtores artesanais de algum lugar remoto empobrecem em vista da invasão de produtos importados do outro lado do planeta.

O outro lado da questão é a disseminação de tecnologia, a melhora inquestionável dos produtos e serviços em face da competição, o incremento do turismo internacional em todos os cantos do mundo, a discussão mais abrangente dos problemas do nosso mundo de forma cada vez mais coletiva, a evolução do combate aos preconceitos de qualquer espécie mesmo em detrimento aos antigos dogmas locais, enfim, apesar das dificuldades e protestos à essa nova situação, uma humanidade menos dividida.

Voltando ao caso de Angola, tive que ir lá e ver com os meus próprios olhos que não posso mais pensar em qualquer lugar pelas impressões que temos sobre uma cultura diferente da nossa. Com a Globalização, os clientes que entrarem na loja de departamentos que estamos projetando são os mesmo que já foram à Nova York, já visitaram Portugal várias vezes e provelmente já compraram no mesmo shopping center que eu também faço minhas compras. Hoje na arquitetura não existe mais a novidade e a exclusividade, existe apenas o processo maior de inovação e tudo é uma parte muito pequena do que está acontecendo.

Daqui pra frente vai ter que ser assim, corremos atrás da globalização, não estamos à frente do nosso tempo, tentando prever coisas que acontecerão no futuro, como foi a gloriosa arquitetura da primeira metade do século XX. Se você pensa em algo novo é porque alguém lá do outro lado do mundo também já pensou, pode ter certeza, ou talvez já fez. Se não fez, alguém naquele universo virtual do Second Life está fazendo, como edifícios flutuantes e coisas assim.

E em matéria de cultura, se você acha que a origem geográfica de uma pessoa pode fazer tanta diferença como antes, pode pensar que um Angolano vai se contentar com qualquer projeto mais elaborado, mas a grande maioria dos cidadãos de classe média já foram à europa, e muitos falam 2 ou 3 idiomas, fora o dialeto da tribo de seus avós. Portanto, em matéria de projeto, pode ser mais difícil agradar um angolano que um brasileiro.

A Globalização mudou tudo, tornou o mundo um lugar mais imprevisível, mais competitivo, eliminou quase que compeltamente ou enfraqueceu as antigas ideologias políticas, culturais e artísticas, tornando a arquitetura um desafio ainda maior, pois não temos mais um contexto limitado para dizer o que é bom ou não é, não podemos mais rotular nosso estilo pois os rótulos se foram, nem podemos nos colocar em um contexto histórico pois as amarras tão combidas pelos revoluçionários da arte já foram superadas. Globalização é a total liberdade de criar e pensar, talvez esteja aí o grande problema, não temos mais o trabalho de negar o passado e o presente, precisamos ir um pouco além, superar esse momento de embriaguês com tanta informação e parar para pensar em qual tipo de humanidade desejamos ser, como queremos viver, que tipo de vida terão nossos filhos e nossos netos. Isso pouca gente tenta prever.


Claudio Yoshimura